Essência e energias em Deus


A distinção - uma distinção real - entre "essência" divina e "energia" divina é inevitável no contexto da doutrina da deificação, a qual implica uma participação do ser humano criado na vida incriada de Deus, cuja essência permanece transcendente e totalmente inacessível. Todos esses aspectos da doutrina de Deus serão, de fato, confrontados simultaneamente na controvérsia entre Gregório Palamas e seus adversários no século quatorze. Sua conclusão necessariamente é que "três elementos pertencem a Deus: essência, energia e a tríade das hipóstases divinas" (Cap. phys., 75).

A tríplice distinção torna-se inescapável tão logo rejeita-se a opção agostiniana de trinitarianismo pela opção dos Padres capadócios. Pois, realmente, se as Pessoas são apenas relações internas à essência, a revelação de Deus, se há, é uma revelação da "essência" ou de seus símbolos criados; as "energias", então, são a própria "essência" de Deus ou sinais criados, e não há distinção real em Deus. Mas se, ao contrário, as Pessoas são distintas da essência, a qual é comum a elas porém transcendente e inacessível ao homem, e se em Cristo o homem encontra Deus "face a face" - e portanto há uma participação real na existência divina -, então essa existência divina participada só pode ser um dom livre de Deus, o qual mantém guardado o caráter inacessível da essência e da transcendência de Deus. Esse Deus que se doa é a "energia" divina; um Deus vivo e pessoal é realmente um Deus que age.

Temos visto que uma doutrina das "energias" na tradição bizantina é central ao entendimento da criação e da cristologia. Recusando-se a reduzir o ser de Deus ao conceito filosófico de simples "essência", o pensamento bizantino afirmou a plena e distinta realidade da vida hipostática Trina de Deus ad intra assim como sua "multiplicação" como criador ad extra. Essas duas "multiplicidades", entretanto, não coincidem. A terminologia recebida pela doutrina das energias, em sua relação com as hipóstases, foi estabilizada na síntese palamita do século quatorze [...].

A tríplice distinção - essência, hipóstases e energia - não é uma divisão do ser de Deus; ela reflete a vida misteriosa daquele "que É" - transcendente, tri-pessoal e presente à Sua criação.

A formulação palamita do século quatorze foi precedida de desenvolvimentos teológicos que lidaram com a mesma tríplice distinção. Em 1156 e 1157, dois concílios locais em Constantinopla debateram se o sacrifício de Cristo - em suas dimensões histórica e eucarística - é oferecido ao Pai somente ou à Trindade. Soterichos, um teólogo, foi condenado porque ensinava que os atos de ofercer e de receber constituíam características hipostáticas do Filho e do Pai, respectivamente - uma opinião que os concílios consideraram uma confusão entre a Trindade "imanente" e a "econômica", ou entre as características hipostáticas e as "energias". E, de fato, as liturgias bizantinas de Basílio e João Crisóstomo incluem no ofertório uma oração direcionada ao Cristo: "Pois Tu és aquele que oferece e que é oferecido, que recebe e é recebido". O mistério da vida hipostática tal como é revelado na Encarnação e no ato de redenção também é expresso no troparion bizantino da Páscoa (repetido pelo sacerdote no ofertório da Eucaristia): "Ó Cristo indescritível! Tu preenches todas as coisas: corporalmente no sepulcro, no Hades com tua alma como Deus, no paraíso com o ladrão; Tu também estás sentado com o Pai e o Espírito".

- Padre John Meyendorff, Teologia Bizantina

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